O reaproveitamento de subprodutos agrícolas não só gera energia, mas também reduz emissões de gases de efeito estufa. Essa circularidade é uma vantagem competitiva que impulsiona o setor agro a adotar soluções energéticas limpas e inovadoras.
O Brasil está emergindo como um dos grandes protagonistas na produção de biogás e biometano, fontes de energia limpa e renovável que estão revolucionando o agronegócio. Nos últimos 20 anos, o país construiu 936 usinas de biogás, sendo que, em 2022, 885 estavam em operação, segundo dados do CIBiogás. Este número posiciona o Brasil na quinta colocação mundial, atrás apenas de potências como Alemanha, Estados Unidos, Itália e França. Embora o país ainda esteja em estágio inicial em relação à história de produção de biogás dessas nações, o Brasil vem crescendo rapidamente, impulsionado pelo enorme potencial agrícola.
O biogás é uma mistura gasosa resultante da decomposição anaeróbica de materiais orgânicos, como restos de culturas, esterco e resíduos alimentares. Ele é composto principalmente por metano (CH4) e dióxido de carbono (CO2), podendo ser utilizado para a geração de energia elétrica e térmica. O biometano, por outro lado, é obtido a partir do biogás, após um processo de purificação que remove o dióxido de carbono, transformando-o em um gás de alta qualidade, comparável ao gás natural fóssil. Este biocombustível pode ser utilizado tanto na indústria quanto no transporte, representando uma alternativa sustentável e economicamente viável.
O Brasil possui uma grande vantagem comparativa para a produção de biogás devido à sua forte produção agrícola e pecuária. O setor agropecuário brasileiro é responsável por uma enorme quantidade de resíduos orgânicos, que podem ser aproveitados para gerar energia. Esterco, restos de culturas como milho e cana-de-açúcar, além de resíduos agroindustriais, são fontes abundantes de matéria-prima para a produção de biogás.
Estudos do CIBiogás indicam que o Brasil tem potencial para produzir até 82 bilhões de metros cúbicos de biogás por ano. Isso representa cerca de 70% da demanda nacional atual de energia elétrica, evidenciando a relevância dessa fonte de energia para a matriz energética do país. O crescimento desse setor não só proporcionaria maior segurança energética, mas também fortaleceria a sustentabilidade ambiental do agronegócio.
Um dos maiores benefícios da utilização de biogás e biometano é a sua capacidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Quando os resíduos orgânicos são descartados de forma inadequada, a decomposição libera grandes quantidades de metano na atmosfera, um gás com potencial de aquecimento global 25 vezes maior do que o dióxido de carbono. Ao capturar e utilizar esse metano na forma de biogás, evita-se sua liberação, contribuindo significativamente para a mitigação das mudanças climáticas.
Além disso, o uso do biometano em substituição ao gás natural ou combustíveis fósseis como o diesel pode reduzir as emissões de CO2 em até 95%, tornando-o uma solução eficaz para a descarbonização de setores intensivos em energia, como o transporte e a indústria.
O biogás também pode ser integrado ao conceito de economia circular, promovendo um ciclo sustentável dentro do agronegócio. O processo de digestão anaeróbica que gera o biogás também resulta em um subproduto chamado digestato, que pode ser utilizado como fertilizante orgânico. Isso fecha o ciclo dos resíduos dentro da propriedade rural, gerando valor agregado ao que antes era descartado e diminuindo a dependência de insumos químicos externos.
A expansão do biogás no Brasil tem sido incentivada por políticas públicas voltadas para o desenvolvimento de energias renováveis, como o programa RenovaBio, que visa aumentar a participação de biocombustíveis na matriz energética brasileira. Com isso, produtores rurais e empresas têm encontrado um ambiente mais favorável para investir na produção de biogás e biometano. Além disso, o governo tem apoiado o desenvolvimento da infraestrutura necessária para o transporte e comercialização do biometano, promovendo seu uso em frotas de veículos e indústrias.
A Eva Energia é uma empresa que atua na geração de energia renovável a partir do biogás, utilizando resíduos de suinocultura e aterros sanitários como principais fontes de matéria-prima. A empresa se destaca por operar três usinas no Brasil, localizadas no Rio de Janeiro, São Paulo e Mato Grosso, somando 20 MW de capacidade instalada. O biogás produzido pela Eva Energia é utilizado para gerar eletricidade limpa, em linha com os princípios da economia circular, ajudando a mitigar as emissões de metano, um dos gases de efeito estufa mais potentes.
Um dos projetos de maior sucesso da Eva é a parceria com a Fazenda Mano Júlio, no Mato Grosso, onde foram instalados biodigestores para transformar os dejetos de suínos em biogás. Essa energia é usada tanto para abastecer as operações da fazenda quanto para ser injetada na rede elétrica. Esse modelo de autossustentabilidade energética já reduziu as emissões de metano em cerca de 25 mil a 30 mil toneladas por ano, além de diminuir o uso de adubos químicos nas lavouras da fazenda em 15%.
Além das fazendas, a Eva Energia também atende clientes corporativos com alta demanda por energia renovável, como redes de supermercados e indústrias, oferecendo um produto alinhado às práticas ESG. Com o objetivo de continuar expandindo, a empresa já planeja novos projetos, incluindo mais usinas de biogás no Rio de Janeiro e parcerias com o setor de etanol de milho para explorar ainda mais o potencial do biogás no Brasil
Apesar dos avanços, o setor ainda enfrenta desafios significativos. Um dos principais entraves é o custo inicial de instalação das plantas de biogás, que pode ser elevado, especialmente para pequenos e médios produtores rurais. Além disso, há a necessidade de uma maior infraestrutura de distribuição para o biometano, uma vez que este precisa ser transportado para os centros consumidores, muitas vezes localizados longe das áreas de produção.
O papel do governo e de investidores privados será crucial para superar esses obstáculos e promover a expansão do biogás e biometano no Brasil. Estima-se que, com os investimentos adequados, a produção de biogás no Brasil possa atingir 11 bilhões de metros cúbicos até 2030, contribuindo para diversificar a matriz energética do país e reduzir sua dependência de fontes fósseis.
O Brasil está em uma posição única para se tornar uma potência mundial na produção de biogás e biometano. Com vastas reservas de biomassa disponível no setor agropecuário e um mercado crescente de energias renováveis, o país tem todas as condições de liderar o desenvolvimento dessa tecnologia. O potencial de crescimento é imenso, tanto no mercado interno quanto nas exportações, uma vez que o biometano também pode ser utilizado em países que buscam reduzir suas emissões de carbono.
Estima-se que, até 2040, o biometano poderá suprir até 50% da demanda nacional de gás natural, colocando o Brasil entre os principais produtores globais. Além disso, a ampliação do uso de biogás em pequenas e médias propriedades rurais poderá democratizar o acesso à energia limpa e renovável, impulsionando o desenvolvimento sustentável no campo.
O biogás e o biometano são duas das principais soluções energéticas para o futuro do agronegócio brasileiro. Além de contribuírem para a segurança energética e a sustentabilidade ambiental, essas tecnologias promovem o desenvolvimento de uma economia circular, agregando valor aos resíduos orgânicos. Com o apoio de políticas públicas, investimentos e a conscientização dos produtores rurais, o Brasil pode se consolidar como um dos maiores produtores de biogás do mundo, desempenhando um papel estratégico na transição energética global.
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